A redistribuição da verba publicitária do governo federal provocou uma crise financeira sem precedentes na emissora da família Marinho. A Rede Globo foi durante algumas décadas a maior beneficiada na distribuição bilionária dos governos federais. Em 2017, por exemplo, ficou com 48,5% das verbas totais. Em 2018, 39,1%. Em 2019, teve direito a 16,3% e sentiu.
A emissora tratou de fazer grandes amputações entre seus veículos de comunicação: jornal, tevê, rádio e internet. Com isso demitiu mais de 100 profissionais em 2019. Em 2020 voltou a fazer cortes e tratou de mandar embora atores e autores consagrados.
A perda do monopólio foi sentida e dentro desse cenário caótico, havia as parcelas pela Copa do Mundo de 2022 que a emissora carioca deveria pagar à Fifa. Em 2011, a Globo e a Fifa tinham assinado um contrato para a transmissão dos principais eventos de futebol até 2022 no valor de 600 milhões de dollares, atuais R$ 3,1 bilhões, dividido em nove parcelas. E, desde maio, a Globo sinaliza que não vai conseguir arcar com a sua parcela de 2020, de 90 milhões de dólares, cerca de R$ 472 milhões, com vencimento para o próximo dia 30 de junho. Já foram pagas seis parcelas. Faltam três.
A Fifa exige que o contrato assinado seja cumprido. A emissora decidiu então procurar a justiça brasileira e da Suíça para tentar fazer um acordo. Na ação, explica que decidiu procurar a intermediação da justiça suíça e que não vai pagar a parcela do dia 30 de junho.
Os trechos tornados públicos pela revista Veja são significativoss.
“A crise é tão grave que a única saída razoável talvez seja o término definitivo do Contrato de Licenciamento, como a Globo, de boa-fé, deixou claro para a Fifa na carta remetida àquela entidade em 19.5.2020:
“‘Em relação ao Acordo de Prorrogação 2018/2022, à luz das circunstâncias materialmente alteradas devido à crise da Covid-19, o valor dos direitos tornou-se desequilibrado e oneroso demais. Diante do exposto, a Globo não vê alternativa real senão buscar a rescisão’.”
“Não é lógico nem razoável exigir da autora [Globo] o desembolso de cerca de R$ 450 milhões (a que se somam os custos fiscais da remessa de valores, que contratualmente recaem sobre a autora) para honrar o pagamento de uma parcela de um contrato que, já sabemos, terá que ser renegociado, com substancial redução de valores (quiçá extinção).
“O impacto financeiro desse pagamento será muito grave para a autora, especialmente nesse momento.”
“A recessão, a crise política, com os protestos de 2015, que culminaram no impeachment da presidente Dilma Rousseff, a substancial desvalorização da moeda (em 2011, a cotação média do dólar foi de R$ 1,90), os impactos das operações de combate à corrupção, notadamente, a Operação Lava-Jato deflagrada em 2014.
“São apenas alguns dos elementos que explicam, por exemplo, a queda de mais de R$ 6 bilhões na expectativa de gastos com publicidade que se inha no ano de 2011, quando firmado o contrato, comparado aos números atuais — e isso sem levar em consideração os efeitos da pandemia da Covid-19.”
Se a Fifa não aceitar adiar ou diminuir o pagamento de cerca de 270 milhões de dólares, cerca de R$ 1,4 bilhão, a emissora brasileira pode ser forçada a abrir mão do direito de retransmitir a Copa do Mundo do Qatar.